quarta-feira, 3 de agosto de 2011

A Conquista do Oeste (How the West Was Won, Henry Hathaway, John Ford, George Marshall & Richard Thorpe, Estados Unidos, 1962)

Estruturado em torno de 5 episódios a cargo de diversos diretores, este filme sofre daquilo que sofrem quase todos os filmes estruturados em episódios rodados por autores distintos: a irregularidade. Em se tratando de Ford, então, a competição fica totalmente desequilibrada. O segmento fordiano, intitulado “The Civil War”, chama a atenção especialmente pela concisão e a economia de recursos expressivos. É de longe o segmento mais tocante, mais intenso e, salvo engano, o mais breve. Ford conta em aproximadamente 25 minutos a história de uma família destruída por conta da Guerra de Secessão. Pai e filho se alistam no exército do norte e partem separadamente para a Batalha de Shiloh. Quando o filho retorna, encontra os túmulos de seu pai, morto na guerra, e de sua mãe, que não suportara a tristeza da perda do marido. Mais uma vez Ford estabelece o conflito entre o dever e a vida familiar, com consequências trágicas. Os outros segmentos até que não são tão destituídos de interesse assim, e o filme como um todo tem uma premissa bastante interessante: acompanhar três gerações de uma família na saga de exploração do oeste americano, num período de 50 anos. Os demais segmentos, porém, são compridos demais, apresentam uma mise-en-scène meio preguiçosa, com excesso de diálogos para dizer o óbvio e fazer andar o enredo, abuso de decupagem careta campo/contracampo, que absolutamente não combina com o formato Cinerama da tela (2,89:1). O segmento dirigido por George Marshall (“The Railroad”) talvez seja o segundo mais interessante, contando a história da construção das grandes linhas ferroviárias e os conflitos com os índios habitantes das terras invadidas. Mas nada que se compare à grandiosidade de Ford.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Os Caça-Fantasmas 1 e 2 (Ghostbusters / Ghostbusters II, Ivan Reitman, Estados Unidos, 1984 / 1989)

Mais um (ou dois) fruto(s) da bela parceria entre Harold Ramis e Bill Murray. Revendo os dois filmes depois de tantos anos, me chamou a atenção o quanto eles têm tanta cara de filme B, aquele jeitão vagabundo, no bom sentido, mesmo com todo o orçamento de que certamente dispuseram. A grande figura é, como sempre, Bill Murray, com seus rompantes de exagero na interpretação. Mas Rick Moranis também tem seus momentos, particularmente na sequência da festa no primeiro filme e na do julgamento no segundo, em que faz as vezes de um advogado completamente inepto. Destaque também para a crítica ao comportamento negativo e estressado da população nova-iorquina, que serve de combustível para o rio de ectoplasma que flui no subsolo da cidade. O primeiro filme peca um pouco por gastar muito tempo na apresentação dos personagens e na criação do grupo dos caça-fantasmas e, por isso, o segundo é ligeiramente melhor, já que já conhecemos os personagens e podemos pular essa parte.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Achado Não É Roubado (Finders Keepers, Richard Lester, Estados Unidos, 1984)

Filme pouco comentado, mas engraçadíssimo do brilhante Richard Lester, mais conhecido pelos filmes rodados com os Beatles (“A Hard Day’s Night”, de 1964, e “Help!”, de 1966) ou os Superman II e III, de 1980 e 1983. Aqui Lester aproveita um roteiro esdrúxulo para criar uma comédia estritamente física repleta de absurdos. O enredo é tão bizarro que nem faz sentido tentar explicá-lo. O que interessa é que o protagonista está em fuga o tempo todo e as situações de trocas de identidades e os acontecimentos absurdos vão se encavalando de tal maneira que o que importa aqui unicamente é o caos. Jim Carrey faz uma ponta mais pro fim do filme, que não chega a chamar muita atenção, a não ser pelo fato de o vermos jovem, quando ainda não era uma celebridade.

sexta-feira, 15 de julho de 2011

A Viagem do Balão Vermelho (Le Voyage du Ballon Rouge, Hou Hsiao-Hsien, França / Taiwan, 2007)

O cinema de Hou Hsiao-Hsien é um cinema sensorial (mesmo querendo, é difícil fugir do clichê). Luiz Carlos Oliveira Jr. comparou sua fruição à da música easy listening. E é bem isso. O cinema de Hou nos encanta pelo prazer dos sentidos. Não que o enredo não importe: nos identificamos com os personagens e nos interessamos por sua história, mas o prazer em assistir ao filme vai além disso. Passa pela câmera suave de Ping Bin Lee, que praticamente dança pela cena. Mas tampouco está só aí. O filme é uma homenagem ao belo “Le Ballon Rouge”, rodado em 1956 por Albert Lamorisse.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

O Quarto Homem (De Vierde Man / The Fourth Man, Paul Verhoeven, Holanda, 1983)

Estou precisando dar uma leve desintoxicada do cinema hollywoodiano, depois de tanto Ford e tanta comédia estadunidense dos anos 80. Aproveito para tentar preencher alguns de meus buracos cinematográficos, vendo mais coisa do Verhoeven, por exemplo, de quem ainda vi muito pouco, mas cujos filmes me impressionaram. Neste filme chama a atenção a criação de climas sinistros para um enredo assustador, que conta a história de uma viúva negra, que atrai os homens para em seguida matá-los. As referências às imagens católicas, envoltas em situações de sexo e violência, criam uma atmosfera um bocado carregada e terrível. Verhoeven cria aqui mais uma de suas figuras femininas fortíssimas, tão presentes em sua filmografia.

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Terra Bruta (Two Rode Together, John Ford, Estados Unidos, 1961)

Ford retoma aqui parte do enredo de “Rastros de Ódio” (“The Searchers”, 1956), na figura de um grupo de caubóis incumbidos de resgatar uma série de indivíduos brancos raptados há anos pelos Comanches. Aqui, porém, o diretor elabora uma crítica mais pesada à maneira autoritária e egocêntrica com que a sociedade branca trata os resgatados, principalmente o jovem plenamente adaptado à cultura comanche. Ford demonstra como a sociedade civilizada, imbuída de valores bem nobres, destrói duplamente a vida desses indivíduos. Em primeiro lugar, o grupo de resgate desrespeita os raptados ao arrancá-los da sociedade comanche (no caso do jovem, explicitamente contra a sua vontade, no caso da moça, com total indiferença por parte dela). Em seguida, os resgatados, uma vez que não se conformam à expectativa que a sociedade branca tinha deles, são por ela rejeitados e tratados com violência (violência física, no caso do jovem, que termina por ser linchado e enforcado; violência simbólica no caso da moça, que é tratada pela sociedade mexeriqueira como uma figura exótica e impura, por ter coabitado com um índio). À moça só resta, como tantas vezes em Ford (vide os filmes em parceria com Will Rogers, ou o próprio “The Searchers”), fugir e tocar sua vida longe dali.

terça-feira, 28 de junho de 2011

Nascimento/Maternidade (Tarachime, Naomi Kawase, Japão / França, 2006)

Desde o nascimento da minha primeira filha, no começo de 2010, e com o/a segundo/a filho/a a caminho, ando totalmente imerso no universo da gestação e do parto. Tenho sentido, nesse processo, falta de filmes decentes que abordem o assunto. A maior parte do que tenho visto se restringe a filmes estritamente informativos, sem qualquer preocupação formal, o que é bastante decepcionante se levamos em conta toda a carga emocional e poética envolvida nessa fase tão bonita da vida. E eis que me deparo recentemente com um belo curta do Artavazd Peleshian (Life / Kyanq, 1993) que retrata poeticamente uma mulher em trabalho de parto. Comecei a me animar, mas o filme ainda é um pouco abstrato demais. E então tive a felicidade de ver este lindo filme da Naomi Kawase, que teve recentemente uma bela mostra dedicada ao seu trabalho no CCBB. Aqui a diretora conta a história de sua relação com a tia-avó, Uno Kawase – que a adotou após a separação dos pais –, já perto da morte, diagnosticada com um câncer de mama. Mais ou menos na mesma época, Naomi engravidou e deu à luz seu filho, pouco antes da morte da mãe adotiva. Permeia o filme essa ideia de continuidade entre vida e morte, entre uma geração e outra. O seio que amamentou Naomi, dando-lhe a vida, é o mesmo que provoca a morte de Uno. No entanto, a família continua, no nascimento de seu filhinho. A câmera predominantemente em close-up se assemelha ao olhar de uma criança, com muita atenção aos detalhes. Por outro lado, temos ao mesmo tempo a sensação de intimidade familiar e de um certo desconforto com os detalhes do corpo em decomposição da mãe adotiva. A relação entre Naomi e Uno tem diversos momentos de ternura, mas tem também seus momentos de forte atrito, como em um dos diálogos do filme, em que a diretora briga com a mãe adotiva por um motivo que não entendemos muito bem. Mas, apesar desse momento ríspido, no fim o que predomina é a doçura, a alegria de fazer parte desse processo de vida.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Wagon Train: The Colter Craven Story (John Ford, Estados Unidos, 1960)

Episódio dirigido por Ford para a série “Wagon Train”, por sua vez inspirada em um filme anterior do diretor, “Wagon Máster” (1950). Carleton Young interpreta um médico alcoólatra, traumatizado pelo que viu durante a Guerra de Secessão, na qual muita gente morreu em suas mãos. Ao se juntar à caravana capitaneada por Ward Bond, o médico se vê obrigado a fazer uma cesariana, mas se nega, alegando que seus traumas o impediriam de realizar a cirurgia. Bond então conta a história de quando conheceu U. S. Grant, futuro herói nacional e presidente dos Estados Unidos, quando ainda era um Zé ninguém lutando contra o alcoolismo. É impressionante como Ford pinta um grande herói nacional do porte de Grant como um cara vulnerável, passível de ser dominado pelo vício e subjugado pelo pai. O filme acaba tendo um quê de história edificante e termina com um tom meio bobo alegre, mas a mão de Ford não deixa a coisa desandar demais e os momentos de crise do médico e a história de Grant são belíssimos.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Audazes e Malditos (Sergeant Rutledge, John Ford, Estados Unidos, 1960)

Bela mistura de faroeste, filme de tribunal, suspense e noir, este filme conta a história do julgamento de um soldado negro, suspeito de estuprar e assassinar uma moça branca e seu pai. Como em “The Sun Shines Bright” (1953), Ford utiliza o enredo para criticar a sociedade hipócrita que descarrega todo seu ódio racial em cima do suspeito, naturalmente revelado como inocente ao fim, quando um homem branco respeitado confessa ser o autor. A estrutura de flashbacks dá um ritmo interessante ao filme, mas é um pouco frustrante que Ford não explore o caráter parcial dos relatos subjetivos das testemunhas, como parece que fará no início, quando o promotor interroga a personagem de Constance Towers. Destaque para a atmosfera de suspense, pouco usual para Ford, na sequência em que Towers desembarca na estação de trem deserta, e para as personagens cômicas do juiz, de sua esposa e do seu assistente.

terça-feira, 14 de junho de 2011

Marcha de Heróis (The Horse Soldiers, John Ford, Estados Unidos, 1959)

Minha primeira impressão é a de que este é um filme menor de Ford, o que não quer dizer que não seja um belo filme (afinal, Ford é sempre Ford), dotado de momentos marcantes: a sequência em que o personagem de William Holden assiste o parto do enésimo filho de uma negra, motivo de embate entre o médico e o personagem racista de John Wayne; a batalha entre um exército de crianças sulistas e a tropa da União comandada por Wayne; a sequência em que Wayne se despede da personagem de Constance Towers, deixando para trás a mulher que ama, para cumprir seu dever militar (Wayne explode a ponte que atravessa, rompendo definitivamente a ligação com a mulher). O filme parece a princípio estar dessa vez do lado nortista na Guerra da Secessão (Ford normalmente se simpatiza com os sulistas em seus filmes, vide “Judge Priest”, “The Sun Shines Bright”), mas a guerra é problematizada, criticando-se os dois lados e exaltando-se a entrega ao dever de ambos exércitos.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Se Beber, Não Case! (The Hangover, Todd Phillips, Estados Unidos / Alemanha, 2009)

Todd Phillips é um cineasta de algum interesse, apesar da irregularidade tão grande de seus filmes. Aqui ele começa muito bem, e o filme tem bastante força no momento da ruptura narrativa que se dá entre o começo da noite de bebedeira do grupo de amigos e a manhã seguinte de ressaca, em que se cria um clima bastante bizarro por conta do quarto de hotel devassado. No entanto, essa força vai se perdendo ao longo do filme, na sanha de se explicar os mínimos detalhes da noite anterior ao longo de sua duração. Isso não impede o filme, porém, de ter belíssimos momentos e personagens marcantes, como o do japa afetado, interpretado por Ken Jeong, ou a hilária participação de Mike Tyson.

terça-feira, 7 de junho de 2011

O Último Hurrah (The Last Hurrah, John Ford, Estados Unidos, 1958)

Ford critica aqui o poder da mídia televisiva e jornalística em criar personalidades da noite pro dia na figura de McCluskey, político completamente inepto, adversário do personagem de Spencer Tracy na eleição para prefeito, mas que é alçado à vitória por conta do apoio dos donos da mídia, que têm restrições pessoais ao atual ocupante do cargo, devido à sua origem humilde. John Carradine tem mais um papel de destaque como o maior rival do prefeito Skeffington, a quem costuma esculhambar em seu jornaleco. Ford mais uma vez aproveita o enredo, sobretudo, para fazer o elogio da honra dos derrotados, tema que lhe é tão caro. Como definiu Peter Bogdanovich em um de seus escritos sobre Ford, grande parte de seus filmes costuma ser sobre a “glória na derrota”. Pois aqui neste filme há um jornalista que usa quase exatamente essa expressão, ao relatar o comportamento de Skeffington após perder a eleição: “Há um ar de derrota aqui, mas que não foi partilhado pelo candidato. Só há uma forma de descrevê-lo: ele foi vitorioso na derrota”.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Get Crazy: Na Zorra do Rock (Get Crazy, Allan Arkush, Estados Unidos, 1983)

Divertidíssimo filme B realizado por Arkush depois do tropeço no infeliz “Heartbeeps” (1981). Arkush confirma seu talento para realizar belos musicais de rock n’ roll, como já havia deixado claro em seu filme mais famoso, “Rock n’ Roll High School” (1979), com os Ramones. Desta vez, ele conta a história de um proprietário de uma modesta casa de shows de rock, que prepara um mega evento de fim de ano, enquanto luta contra um megaempresário inescrupuloso que pretende comprar o imóvel para transformá-lo em um prédio comercial. A história tão batida é desenvolvida muito bem por Arkush, que usa de forma bastante engraçada o recurso de legendas para ressaltar os clichês da narrativa: por exemplo, “boy meets girl” na sequência em que o protagonista se apaixona por uma garota, ou “the bad guys” quando o vilão e sua trupe entram em cena. O que importa de fato, no entanto, não é a história, mas a música e as diversas piadas com a cena musical dos anos 80. Lou Reed faz uma ponta como um cantor folk inspirado em Bob Dylan, Malcolm McDowell encarna uma imitação hilária de Mick Jagger e o filme conta ainda com uma banda de blues, uma banda feminina de new wave com a participação especial do vocalista da banda punk Fear e um grupo hippie tipo Grateful Dead. Há ainda a bela participação especial de atores frequentes nos filmes de Arkush ou de seu parceiro Joe Dante, como Robert Picardo, Dick Miller, Paul Bartel e Mary Woronov. Em poucas palavras, o filme é uma pérola obscura e pouquíssimo comentada. Pena que a carreira de Arkush não tenha ido muito para a frente e ele tenha passado a dirigir apenas para a TV a partir do fim dos anos 80, porque o cara claramente tinha talento.

terça-feira, 31 de maio de 2011

Um Crime por Dia (Gideon’s Day, John Ford, Inglaterra, 1958)

Outro filme mais “modesto” de Ford, também sem grandes estrelas, rodado fora dos Estados Unidos, com orçamento bem mais baixo que o de suas grandes produções. À primeira vista, para um olhar mais distraído, pode parecer um filme estranho ao diretor, por ser um policial, passado na Inglaterra, mas estão aqui algumas das obsessões de Ford, como o conflito entre dever e vida familiar, e o seu humor peculiar. Jack Hawkins interpreta um inspetor da Scotland Yard, retratado em um dia de sua vida. Cheio de crimes para investigar, o inspetor passa seu dia tentando conciliar, sem sucesso, seu dever policial com seus compromissos familiares. O filme tem uma estrutura episódica e uma atmosfera bastante melancólica, apesar da profusão de ótimos momentos cômicos, bem à maneira fordiana.

quinta-feira, 26 de maio de 2011

My Breakfast with Blassie (Linda Lautrec, Johnny Legend & Mark Shepard, Estados Unidos, 1983)

Paródia do bom “My Dinner with André” (Louis Malle, 1981), este filme tem uma premissa bastante simples: reunir Andy Kaufman e o lutador de luta livre Fred Blassie em um café da manhã, para conversar besteira e hostilizar seus vizinhos de mesa. Os vizinhos são interpretados por atores, mas essa informação não nos é dada pelo filme, o que torna os conflitos de Kaufman e Blassie com os clientes um tanto surpreendentes. Destaque para o fã interpretado pelo parceiro de Kaufman, Bob Zmuda, que devolve a grosseria dos dois, tocando o terror na mesa deles. Enfim, o filme é meio que uma besteira, mas é bastante engraçado e vale pelo pouco registro que se tem da atuação de Kaufman, comediante tão importante para a história da comédia estadunidense.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Uma Tacada da Pesada (Deal of the Century, William Friedkin, Estados Unidos, 1983)

Mais um dos muitos filmes subestimados e pouquíssimo comentados de Friedkin. Chevy Chase interpreta um vendedor ilegal de armas que acaba se envolvendo meio que por acidente em uma negociação milionária entre uma fabricante estadunidense de armamentos e o governo ditatorial de um país latino-americano fictício. Também acabam se envolvendo nessa negociação os personagens de Sigourney Weaver e Gregory Hines. O filme estabelece várias relações meio óbvias, mas nem por isso desprovidas de graça, entre poder, arma e falo, como na sequência em que Weaver, com intuito de convencer o ditador a concluir o negócio, visita-o em seu quarto de hotel. Durante o sexo, a câmera enquadra uma tela de TV que exibe várias cenas de guerra, enquanto ouvimos os gemidos e a conversa dos dois. O ponto fraco do filme fica por conta do personagem demasiado estereotipado de Hines, um ex-militar que se envolve na venda ilegal de armas e posteriormente se converte ao cristianismo, tornando-se progressivamente um fanático religioso, a ponto de sequestrar um avião e ameaçar a realização de uma feira internacional de armamentos em protesto "pacifista", numa sequência meio impensável para a Hollywood pós-11 de setembro. O título em português, a propósito, é absolutamente incompreensível.

terça-feira, 17 de maio de 2011

Asas de Águias (The Wings of Eagles, John Ford, Estados Unidos, 1957)

Biografia de Spig Wead, ex-oficial da marinha que se tornou roteirista depois de um acidente que o deixou paraplégico, este é um filme-irmão de “The Long Gray Line”, realizado dois anos antes. Há várias semelhanças entre os filmes, mas aqui a visão da vida militar é mais desencantada. Wead, interpretado por John Wayne, não consegue conciliar sua carreira com a vida familiar e é afastado da família por conta do dever. Em um determinado momento, ao voltar pra casa depois de muitos anos fora, suas filhas o recebem sem reconhecê-lo, ao que Wead contesta: “Vocês não leem jornal? Eu sou seu pai!” Wead tenta por várias vezes durante o filme, sem sucesso, se reconciliar com sua esposa, interpretada por Maureen O’Hara. Apesar do clima um tanto pesado e pessimista, o filme tem também belos momentos cômicos, principalmente na participação de Dan Dailey, cujo talento já havia chamado atenção em “When Willie Comes Marching Home” (1950) e “What Price Glory” (1952). Ward Bond faz uma bela ponta na pele de um diretor de cinema chamado John Dodge, com quem Wead vai trabalhar depois de seu acidente, uma clara referência ao próprio Ford. Em uma imitação bastante engraçada, Bond reproduz o visual excêntrico e alguns dos famosos tiques do diretor.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Férias Frustradas (National Lampoon’s Vacation, Harold Ramis, Estados Unidos, 1983)

Escrito por John Hughes (que mais tarde dirigiria clássicos como “Clube dos Cinco” / “The Breakfast Club”, 1985, e “Curtindo a Vida Adoidado” / “Ferris Bueller’s Day Off”, 1986) e dirigido por Harold Ramis, este filme não tinha como não ser a pérola que é. Chevy Chase está hilário no papel de um pai manezão que leva a família numa viagem de carro atravessando os Estados Unidos, de Chicago à Califórnia, para ir ao parque de diversões Walley World, uma clara referência à Disneylândia. O filme é um misto de comédia de erros e road movie, em que as férias perfeitas planejadas pelo pai viram um inferno por conta de várias situações esdrúxulas em que a família se mete. Ao ver seus planos de umas férias felizes em família irem pro saco, o personagem de Chevy Chase vai então progressivamente perdendo o controle e a noção, até que, no clímax do filme, ao ver que o parque estaria fechado por duas semanas para reforma, decide entrar à força, à mão armada. Além da bela atuação de Chase, o filme tem ainda a ótima participação de grandes atores cômicos: Imogene Coca, Randy Quaid, Brian Doyle-Murray, Eugene Levy, John Candy.

terça-feira, 26 de abril de 2011

The Rising of the Moon (John Ford, Irlanda / Estados Unidos, 1957)

Outro belíssimo exemplo de um dos filmes mais “modestos” de Ford, como “Wagon Master” (1950) e “The Sun Shines Bright” (1953), mais pessoais, de orçamento mais baixo, e sem grandes estrelas no elenco (aqui todos os atores são irlandeses, à exceção de Tyrone Power, que faz uma ponta como o apresentador das três histórias curtas que compõem o filme). Ford volta à Irlanda mais uma vez, para contar três histórias cômicas da literatura irlandesa, que pintam os irlandeses como criaturas bastante peculiares. A estrutura em episódios é uma bela oportunidade para Ford exercitar seu talento cômico baseado em esquetes e no desenvolvimento ágil de diversos personagens, muito bem desenvolvidos em traços rápidos. A terceira história, intitulada “1921” é a que chama mais a atenção por sua construção visual, com enquadramentos diagonais reminiscentes da admiração pelo expressionismo alemão (e Murnau em particular) que dominou a obra de Ford nos anos 20 e 30. Os enquadramentos peculiares retratam bem a atmosfera de instabilidade da guerra irlandesa pela independência, contexto no qual a história se desenvolve. Mas ainda prefiro a leveza e aparente simplicidade do segundo segmento (“A Minute’s Wait”), em que um trem faz uma “breve” parada em uma estação, prevista apenas para um minuto. No entanto, a partida é impedida diversas vezes por episódios inusitados, como o embarque de última hora de uma cabra, seguido de um carregamento de lagostas e, por fim, de um time de hóquei cujo ônibus havia quebrado. Ford utiliza muito bem a estrutura musical dos diversos embarques e desembarques de passageiros para elaborar esquetes que envolvem uma quantidade impressionante de personagens tão bem desenvolvidos para um tempo tão reduzido. O primeiro segmento também não fica muito atrás, em seu retrato cômico de um policial enviado para prender um amigo acusado de violência contra um terceiro. O policial oferece ao amigo a possibilidade de pagar uma multa para evitar a prisão, mas o acusado prefere defender sua honra indo à prisão, mas não imediatamente, uma vez que o policial lhe permite ir voluntariamente, no momento que melhor lhe convier.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Rastros de Ódio (The Searchers, John Ford, Estados Unidos, 1956)

Esperei ansioso pela experiência quase sagrada de assistir a este filme em película, na mostra do Ford que aconteceu ano passado no CCBB. A revisão da obra, ainda mais numa sala de cinema, em película, como as grandes obras devem ser vistas, tornou-a ainda mais sensacional. John Wayne encarna aqui, pela enésima vez na obra de Ford, o típico herói condenado à solidão, que entra em cena para cumprir o seu dever (nesse caso, o de resgatar a sobrinha raptada por índios Comanches) e ir embora sozinho no fim. O humor de Ford está afinadíssimo aqui, principalmente nas figuras hilárias interpretadas por Ken Curtis (sua briga com o personagem de Jeffrey Hunter, antes do casamento com Vera Miles, é memorável) e Hank Worden (que passa o filme inteiro em busca de sua cadeira de balanço em frente à lareira, em diálogo com outra constante na obra de Ford: a busca do homem pela paz de espírito). A propósito, a linda música-tema do filme fala justamente dessa eterna busca: “A man will search his heart and soul / Go searchin' way out there / His peace of mind he knows he'll find / But where, O Lord, Lord where? / Ride away, ride away”. A famosa sequência final é arrebatadora e ilustra belissimamente o caráter e o destino do personagem. Wayne carrega a sobrinha nos braços até a casa dos Jorgensen, ao som da música-tema, enquanto Hank Worden balança em sua cadeira no alpendre. Depois que todo mundo entra em casa, Wayne parte sozinho, e a porta se fecha para a sua solidão.

terça-feira, 5 de abril de 2011

The Promotion (Steven Conrad, Estados Unidos, 2008)

Estrelado por Sean William Scott e John C. Reilly, este filme tira um belo sarro do espírito self-made-man, da luta desesperada pelas promoções e dos discursos motivacionais de auto-ajuda. Scott e Reilly interpretam dois funcionários de uma rede de conveniência, que brigam pela posição de gerente de uma nova franquia da rede que está para abrir. Inicialmente, o filme dá um pouco de desânimo por parecer descambar muito para o estereótipo no trato com os personagens, mas da segunda metade para a frente ele ganha fôlego, pois os personagens, principalmente o de Reilly, vão se revelando mais complexos e a briga cada vez mais desesperada pela posição torna-se mais engraçada. Mas o filme peca, ainda assim, por piadas um tanto preconceituosas e por abusar muito dos estereótipos (como o dos canadenses gente boa, o dos chicanos zoadores e dos negros encrenqueiros).

terça-feira, 29 de março de 2011

Screen Directors Playhouse: Rookie of the Year (John Ford, Estados Unidos, 1955)

Metáfora crítica à “caça às bruxas” macartista dos anos 50, este média (feito para a série televisiva “Screen Directors Playhouse”) conta a história de um jornalista, interpretado por John Wayne, que trabalha num jornaleco interiorano e que vê sua chance de se projetar quando suspeita que o jogador de beisebol sensação do momento é filho de um ex-jogador que foi banido do esporte por se envolver em práticas de manipulação de resultados. Ford reflete novamente, como em “Fort Apache” (1948) e “The Man Who Shot Liberty Valance” (1962) sobre o papel dos jornalistas em omitir fatos para construir a versão histórica oficial. Nesse caso, há um pacto de silêncio, para que a revelação do fato não venha a manchar a carreira do jovem jogador, destruindo sua reputação e, consequentemente, secando uma fonte para a mídia esportiva, ávida por ídolos.

segunda-feira, 21 de março de 2011

Mister Roberts (John Ford, Mervyn LeRoy & Joshua Logan, Estados Unidos, 1955)

Apesar de ser apontado como um filme problemático, em decorrência dos conflitos entre Ford e Henry Fonda durante as filmagens e do crescente problema do diretor com a bebida, que o fizeram largar o filme no meio, de forma que Mervyn LeRoy e Joshua Logan foram escalados para terminá-lo, este filme tem bastante a cara de Ford. Notam-se alguns deslizes, mas, no geral, é um bom filme. Está presente novamente o sentimento ambíguo de Ford em relação à vida militar: o elogio da camaradagem entre os marinheiros, confrontado com a crítica à truculência de certos militares, personificada aqui no personagem de James Cagney, um capitão arrogante que lembra um pouco o Coronel Thursday que Fonda interpretara em “Fort Apache” (1948). A tripulação do navio comandado por Cagney se identifica fortemente com Fonda, em seus rompantes de insubmissão e confrontamento ao capitão. Grande parte do humor fica por conta de Jack Lemmon, que está engraçadíssimo em um de seus primeiros papéis no cinema.

segunda-feira, 14 de março de 2011

Trocando as Bolas (Trading Places, John Landis, Estados Unidos, 1983)

Landis faz um filme ao mesmo tempo engraçadíssimo, mas profundamente triste em sua visão desencantada da sociedade americana capitalista dos anos 80. Não há quem se salve aqui. Até os “heróis” do filme, representados por Dan Aykroyd e Eddie Murphy, vitimizados pela ganância dos irmãos magnatas que os tratam como joguete em suas apostas, só podem responder na mesma moeda, se enriquecendo à custa do empobrecimento dos vilões. A aposta em questão é proposta por um dos irmãos, com base na teoria de que o meio é o que molda a personalidade de cada indivíduo. Para provar isso, ele pega dois indivíduos, o administrador da empresa dos irmãos e um pedinte trapaceiro que se finge de cego e aleijado, e dá um jeito para que troquem de lugar. Assim, os irmãos pretendem ver se o administrador vira um ladrão, enquanto o mendigo vira um homem de respeito e um bom funcionário. A história tem um quê de paráfrase à história de Jó, em que o Diabo desafia a Deus, querendo provar que seu servo fiel o amaldiçoaria se perdesse tudo o que tem. O clímax do filme, na sequência da bolsa de valores, é uma paródia sensacional do espírito yuppie / capitalista selvagem estadunidense dos anos 80. Como atrativo paralelo para a ala masculina, Jamie Lee Curtis, como em grande parte dos filmes do início de sua carreira, põe os peitos de fora um par de vezes.

quinta-feira, 10 de março de 2011

The Hole (Joe Dante, Estados Unidos, 2009)

É muito bom ver Joe Dante de volta à ativa, depois de tanto tempo no ostracismo. Desde o inacreditável “Looney Tunes: Back in Action” (2003), o único que Dante havia feito de significativo eram dois episódios para a série televisiva “Masters of Horror” (o muito bom “Homecoming”, de 2005, e o apenas razoável “The Screwfly Solution”, de 2006). Fora isso, apenas episódios isolados de séries e curtas para a internet. Aqui ele retorna ao cinema, com um belo filme B, um conto infanto-juvenil sobre o enfrentamento do medo. Há claras referências a trabalhos anteriores do diretor (parte da trama lembra um pouco a série “Eerie Indiana”, realizada entre 1991 e 1992, e de cuja equipe criativa Dante participou; há um palhaço monstrengo que lembra bastante um gremlin; a casa que fica dentro do buraco lembra a de “It’s a Good Life”, episódio que Dante dirigiu para o coletivo “Twilight Zone: The Movie”, de 1983) e o sempre presente Dick Miller faz uma pontinha. Apesar de esse filme não ter a menor cara de potencial de sucesso (no crivo imbecil do público pasteurizado dos multiplexes, filme de terror que não dá muito medo não presta; filme de comédia que não faz gargalhar a cada segundo é uma merda etc, sem querer generalizar demais, mas um pouco de generalização é bom para reforçar a argumentação), esperemos que Dante volte de fato à ativa, pois seus filmes deixam saudade, desde os clássicos “Piranha” (1978), “Explorers” (1985), “Innerspace” (1987) e “Matinee” (1993), até os mais modestos mas não menos geniais “Runaway Daughters” (1994) e “The Second Civil War” (1997).

quinta-feira, 3 de março de 2011

A Paixão de uma Vida (The Long Gray Line, John Ford, Estados Unidos, 1955)

Mais uma declaração de amor de Ford ao exército. Tyrone Power faz o papel de Martin Maher, um militar confrontado com uma aposentadoria compulsória depois de passar 50 anos na academia militar de West Point, lugar que dá sentido à sua vida. O que é curioso é que o personagem parece ter no início bastante dificuldade de se adaptar à rigidez da disciplina militar, por ser um tanto insubordinado. Ironicamente, Maher decide se alistar quando, depois de quebrar vários pratos em seu serviço de garçom na academia e ficar devendo bem mais que o seu salário, descobre que os militares não podem ser multados por quebrarem pratos. Em relação conflituosa com a vida militar, Maher resolve, por diversas vezes, ao longo desses 50 anos de academia, abandonar a carreira, mas sempre acaba mudando de ideia por diversas razões, até que, por fim, se afeiçoa àquela vida, da qual não faria mais sentido abdicar. A tônica do filme, como em vários do diretor, é essa dicotomia entre disciplina, ordem, de um lado, e liberdade, autonomia, de outro. Seu sentimento dúbio em relação ao exército está presente tanto nos momentos engraçadíssimos em que Ford tira um sarro da rigidez militar, quanto no olhar deslumbrado para os desfiles e na forte amizade entre os soldados que vivem na academia. Maureen O’Hara faz o papel da esposa irlandesa durona e sentimental, lembrando a Mary Kate de “The Quiet Man” (1952). O filme conta ainda com a sempre bem-vinda presença de grandes atores-fetiche de Ford: Ward Bond, Donald Crisp, Harry Carey Jr., Patrick Wayne, Jack Pennick.

terça-feira, 1 de março de 2011

O Brinquedo (The Toy, Richard Donner, Estados Unidos, 1982)

Sessãozona da tarde este filme, com o que isso pode ter de bom e de ruim. As piadas referentes à escravidão são bem infelizes, particularmente quando o filho do magnata escolhe na loja de brinquedos de seu pai o personagem de Richard Pryor como seu presente e vemos ao fundo do plano uma bandeira dos Estados Conferados escravocratas da época da Guerra de Secessão. As piadas de conteúdo sexual que envolvem o menino também soam um pouco bizarras, ainda mais se soubermos que o ator mirim Scott Schwartz virou ator pornô depois de adulto. Incomoda também a trilha sonora emocional histérica e onipresente, que é acionada toda vez que o filme quer nos enfiar goela abaixo lições de moral com valores nobres como a importância da família e coisas do tipo. Fora os muitos defeitos, porém, o filme tem bons momentos cômicos, principalmente na interação entre Jackie Gleason e o genial Pryor (afinal, sua presença costuma compensar filmes medianos). Ned Beatty também tem seus momentos quando contracena com Pryor. O trabalho do diretor Richard Donner, no entanto, acaba sendo meio decepcionante, uma vez que ele dirigiu belos filmes (alguns que não vejo há muito tempo, mas que deixaram boas lembranças em minha cinefilia infantil) como “Superman” (1978), “Goonies” (1985), “Os Fantasmas Contra-Atacam” (“Scrooged”, 1988) e o mais recente “16 Blocks” (2006).

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Brincou com Fogo... Acabou Fisgado! (Continental Divide, Michael Apted, Estados Unidos, 1981)

Escrito por Lawrence Kasdan, este é o único filme em que John Belushi tem um papel mais “sério”, ainda mais contido que em “Neighbors”, que afinal, apesar da atuação com menos estardalhaço de Belushi, era ainda uma comédia bem escrachada. O resultado é até interessante, embora o filme não passe muito de uma comédia romântica sem grandes atrativos além da presença de Belushi. Sua interpretação mais contida, no entanto, é atrativo suficiente e prova da abrangência de seu repertório, do qual infelizmente temos poucos exemplos devido a sua morte prematura. Apesar da interpretação menos chamativa, Belushi está, como sempre, bastante engraçado na pele de um jornalista investigativo mandado para as montanhas do Colorado por seu editor, depois de mexer com um político corrupto que envia uns policiais para lhe darem um trato, mandando-o ao hospital. Seu papel nas montanhas é o de entrevistar uma especialista em águias, por quem, obviamente, em se tratando de uma comédia romântica, o personagem de Belushi se apaixonará.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Mogambo (John Ford, Estados Unidos, 1953)

Este filme estabelece um diálogo interessante com “What Price Glory” (1952), pela forte semelhança entre os enredos e pelo uso de uma situação espaço-temporal extrema (ali a I Guerra Mundial, aqui uma selva africana) como mero pretexto para por em relevo as paixões acirradas dos personagens. Ambos os filmes se desenvolvem em torno de uma história bastante simples: duas pessoas que brigam pelo amor de uma terceira. Aqui, no entanto, são duas mulheres (Ava Gardner e Grace Kelly) que disputam um homem (Clark Gable). E, enquanto no filme anterior os militares brigavam abertamente pela moça, chegando várias vezes ao confronto físico, aqui o duelo é mais sutil, mais encoberto, até porque a personagem de Kelly é casada e tem seu marido sempre por perto. Mas, de qualquer forma, essa diferença diz muito da visão que Ford tem das particularidades de cada sexo. No fim, a personagem de Gardner se revela a típica heroína fordiana, por impedir a dissolução do casal, preservando sua própria inimiga. Apesar de Gardner e Gable terminarem juntos, o verdadeiro amor é impossível, como quase sempre em Ford, já que Kelly permanece em sua vida conjugal infeliz, Gable perde a mulher que verdadeiramente ama e fica com Gardner, para ele mero objeto, apenas por conveniência. Apenas Gardner consegue o que quer, ainda que, para isso, provavelmente tenha que abrir mão de sua felicidade.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Um Lobisomem Americano em Londres (An American Werewolf in London, John Landis, Estados Unidos / Inglaterra, 1981)

Landis está aqui mais próximo do terror do que de seu território usual, a comédia, ainda que o filme seja bastante engraçado grande parte do tempo. Como na maioria dos filmes do diretor, as melhores sequências se passam à noite, momento ideal para as perseguições, as batidas de carro, os desastres, o caos, que tanto apetecem a Landis. As sequências de ataque do lobisomem são um primor de timing e uma soberba aula de edição. Destaca-se a engraçadíssima sequência no cinema pornô, em que David discute com suas vítimas a melhor forma de se suicidar, para quebrar a maldição do lobisomem.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

O Sol Brilha na Imensidão (The Sun Shines Bright, John Ford, Estados Unidos, 1953)

Este é mais um dos filmes de Ford que sofrem de leituras equivocadas. A mentalidade politicamente correta de hoje se incomoda, por exemplo, com o personagem estereotipado do criado negro interpretado por Stepin Fetchit, o mesmo de “Judge Priest” (1934). Mas, por mais que tenha sido acusado tantas vezes de reacionário, Ford mostra aqui mais uma vez o espírito libertário por trás das posições políticas direitistas que expressava. O juiz Priest, revivido aqui por Charles Winninger, pois o original Will Rogers havia morrido duas décadas antes, se identifica com os injustiçados, com os deserdados, aqui especificamente as prostitutas e os negros em uma sociedade sulista racista e moralista. Ford faz aqui, na figura de Priest, o elogio dos gestos simples, contra toda a pompa e o estilo empolado de seu adversário Maydew. Destaca-se, quase no fim do filme, a longa sequência silenciosa do cortejo fúnebre em torno do caixão da mãe de Lucy Lee, puxado inicialmente apenas por Priest e pelas outras prostitutas, mas ao qual se juntam diversos habitantes da cidade. A comicidade do filme fica novamente a cargo de Stepin Fetchit e de Francis Ford, este último em seu derradeiro papel antes de morrer, no mesmo ano.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Sangue por Glória (What Price Glory, John Ford, Estados Unidos, 1952)

Tido como um filme “menor” na carreira de Ford, este é ainda assim um grande filme. James Cagney e Dan Dailey interpretam dois militares rivais (apesar de integrarem o mesmo regimento), que brigam pelo amor de uma garçonete francesa (interpretada pela mesma Corinne Calvet que havia feito uma francesa por quem Dailey se apaixona em “When Willie Comes Marching Home” (1950). Os duelos verbais entre os dois são sensacionais e o humor de Ford está afiado como sempre. Como usualmente ocorre em Ford, o amor é impossível e os três só podem terminar sozinhos, já que os dois militares não podem fugir de seu dever de lutar e, por isso, abdicam do amor da moça. Não compreendo exatamente o porquê de esse ser considerado um filme menor do diretor, pois é realmente muito bom. A bela fotografia de cores carregadas do Technicolor dá uma atmosfera bastante irreal às cenas de batalha, o que se relaciona à pouquíssima importância que a guerra tem na trama, apesar de a história toda se passar durante a I Guerra Mundial. A guerra é, aqui, nas palavras de Tag Gallagher, um inferno surreal.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Fábrica de Robô (Heartbeeps, Allan Arkush, Estados Unidos, 1981)

Apesar de ser dirigido por Allan Arkush, que havia realizado anteriormente os divertidos “Hollywood Boulevard” (1976) e “Rock n’ Roll High School” (1979), em parceria com Joe Dante, e de ser um dos únicos filmes estrelados por Andy Kaufman, este filme é bem decepcionante. Nem mesmo a participação de grandes figuras como Dick Miller, Christopher Guest, Paul Bartel e Mary Woronov salvam essa comédia bem sem graça boa parte do tempo. O enredo gira em torno de um casal de robôs em manutenção, que se apaixonam e fogem da fábrica, perseguidos por um robô policial. Há ainda um robô que faz uma espécie de comédia stand-up com piadas sofríveis durante todo o filme e cuja presença traz alguma graça. A interpretação de Kaufman, porém, é bem apagada, porque restrita a um personagem desinteressante. Vale, no entanto, pela raridade de vê-lo atuando num filme. E, na linha do “tão ruim, que é bom”, até que o filme tem seus momentos.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Depois do Vendaval (The Quiet Man, John Ford, Estados Unidos, 1952)

Mais um filme de Ford que passa um forte sentimento de filme “de galera”. Estão aqui vários de seus atores recorrentes: John Wayne, Maureen O’Hara, Barry Fitzgerald, Ward Bond, Victor McLaglen, Francis Ford, Arthur Shields. A Irlanda retratada por Ford aqui traz um contraste interessantíssimo entre a nostalgia de uma terra pintada de belas cores de um Technicolor carregado e a violência de uma comunidade à qual o personagem de Wayne tem muita dificuldade de se adaptar, devido a suas regras sociais e suas fortes tradições. Aqui, no entanto, a adaptação, apesar de penosa, é possível, ao contrário dos filmes com Will Rogers, em que ao herói não resta outra saída senão fugir.Nota-se, portanto, mais esperança aqui que em grande parte dos filmes anteriores de Ford.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Guerra ao Terror (The Hurt Locker, Kathryn Bigelow, Estados Unidos, 2008)

O fuzuê em torno de “Guerra ao Terror” (título infeliz e apelativo que não tem absolutamente qualquer relação com o filme) foi bom para despertar o meu interesse pelo trabalho até então desconhecido por mim de Kathryn Bigelow, que se revelou uma belíssima cineasta. Bigelow tem enorme talento para a encenação de sequências de ação, que dão toda a força ao filme, principalmente em suas principais sequências, as de desarmamento de bombas. Tido equivocadamente como apolítico, o filme se centra na história de um sargento viciado em desarmar bombas, que se interessa mais pela guerra que pela mulher e filho que ficaram pra trás, prescindindo diversas vezes de medidas de segurança e pondo em risco seus colegas do esquadrão anti-bombas, pelo simples prazer do risco (como diz a epígrafe do filme, em tradução livre: “A adrenalina da batalha é muitas vezes um vício potente e letal, pois a guerra é uma droga”).

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Apertem os Cintos, o Piloto Sumiu (Airplane!, Jim Abrahams, David & Jerry Zucker, Estados Unidos, 1980)

Esta é a estreia do trio Zucker, Abrahams & Zucker na direção, depois de terem roteirizado o divertido mas irregular “The Kentucky Fried Movie” (John Landis, 1977). A quantidade meio exagerada de piadas que se encavalam umas sobre as outras faz com que várias delas sejam meio sem graça, mas o filme tem várias piadas engraçadíssimas, principalmente os jogos de linguagem com os nomes dos personagens. Leslie Nielsen demora a aparecer, mas rouba a cena depois que aparece. A participação de Lloyd Bridges também é sensacional.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Estranhos Vizinhos (Neighbors, John G. Avildsen, Estados Unidos, 1981)

Retomando a bela dupla de “The Blues Brothers” (John Landis), rodado no ano anterior, esta comédia de humor negro tem como protagonistas John Belushi e Dan Aykroyd, funcionando novamente bem em bela química. Belushi faz o papel de um pai de família caretão, que passa a ter sua pacata vida perturbada quando um casal (Aykroyd e Cathy Moriarty) se muda para a casa ao lado. Os vizinhos entrões tocam o inferno na vida de Belushi, que, ao mesmo tempo em que aparenta se irritar profundamente, passa a nutrir uma admiração secreta pelo estilo de vida aventureiro e anárquico do casal. É interessante ver Belushi num papel mais contido, pois quem o viu atuando anteriormente em “The Blues Brothers” e, principalmente, em “Animal House” (John Landis, 1978), com seu humor físico exagerado, espera que ele exploda a qualquer momento. A trilha sonora de desenho animado chega a irritar no começo pela sua onipresença, mas aos poucos se revela adequada e se encaixa perfeitamente ao tom cartunesco do filme. O diretor, John G. Avildsen, talvez seja digno de um pouco mais de atenção, uma vez que realizou pelo menos outro bom filme em 1976: “Rocky”.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

This Is Korea! (John Ford, Estados Unidos, 1951)

Na superfície apenas um filme de propaganda, feito para explicar o propósito de uma guerra incompreendida pelos estadunidenses à época, este documentário é uma oportunidade para Ford celebrar os soldados anônimos, que estão ali para cumprir um dever ante a pátria, mesmo não entendendo muito bem o motivo da guerra. Não há aqui quase nada do que se espera de um documentário estadunidense sobre a guerra, poucos comentários políticos, nada sobre estratégia militar ou táticas de guerra. O inimigo não aparece nem de relance. O foco está concentrado no sofrimento dos soldados bucha-de-canhão, heróis anônimos bem típicos do cinema de Ford.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Smiley Face: Louca de Dar Nó (Gregg Araki, Estados Unidos / Alemanha, 2007)

Ainda que o filme perca o tom em alguns momentos e pareça em grande parte um pouco equivocado, a presença cômica de Anna Faris tem bastante força aqui. O filme é basicamente uma comédia de erros centrada na personagem de Faris, que passa o tempo todo chapada de maconha e interage com personagens bastante interessantes, como os interpretados por Danny Masterson, John Krasinski, Danny Trejo e John Cho. Apesar do tom meio afetado, o filme tem vários momentos bastante engraçados, como a sequência em que Faris faz um discurso comunista/pró-sindicato/anti-carnívoro na fábrica de linguiças.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Caravana de Bravos (Wagon Master, John Ford, Estados Unidos, 1950)

1950 foi mais um ano inspiradíssimo para Ford, uma vez que o diretor realizou no mesmo ano três belíssimos filmes (além deste, “When Willie Comes Marching Home” e “Rio Grande”, o melhor dos filmes da trilogia da cavalaria). Novamente, como em “3 Godfathers”, a história é uma alegoria bíblica, dessa vez a busca pela Terra Prometida. Ward Bond interpreta o líder de uma comunidade mórmon em deslocamento até um vale propício no qual se estabelecer. Em resposta a suas orações, Deus envia dois vendedores de cavalo, interpretados por Ben Johnson e Harry Carey Jr., que ajudarão a comunidade a atravessar o deserto até a Terra Prometida. Também como em “3 Godfathers”, o tom é de esperança, uma vez que a convivência dos mórmons com os diferentes grupos que se juntam à caravana (os vendedores de cavalo, a trupe de artistas mambembes, os bandidos Cleggs) é pacífica. Essa convivência com os diferentes, a propósito, gera grande parte do humor do filme, como na sequência em que o personagem de Carey diz algo como “isso aqui vai ficar quente como o inferno”, ao que é repreendido por um mórmon. Carey então responde: “inferno não é palavrão, é geografia”. A convivência é pacífica também com os índios Navajos com os quais a caravana cruza e aos quais se junta em uma festa. Até mesmo a convivência com os bandidos Cleggs é possível de ser pacífica, até o momento em que os bandidos resolvem roubar as sementes que, nas palavras do líder mórmon, “valem mais que ouro”. Nesse momento, os bandidos têm que ser eliminados, como serpentes (nas palavras do personagem de Johnson, sua arma só é usada para matar serpentes) que manchariam o paraíso da Terra Prometida.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Recrutas da Pesada (Stripes, Ivan Reitman, Estados Unidos, 1981)

Este blog já tá virando um festival de traduções trash de títulos de filmes. Mas também tradução de título de comédia é foda. Neguinho sempre quer dar um título engraçadinho e saem essas pérolas, ainda mais em se tratando de anos 80. Este filme é o terceiro fruto da bela parceria entre Bill Murray e Harold Ramis (roteirista e co-protagonista). Os dois já haviam feito anteriormente o mediano mas engraçado “Meatballs” (Ivan Reitman, 1979), além do muito bom “Caddyshack” (Harold Ramis, 1980), e fariam ainda os clássicos “Ghostbusters” I e II (Ivan Reitman, 1984 e 1989) e “Groundhog Day” (Harold Ramis, 1993). Aqui Murray tem bem mais espaço que em “Meatballs” para o improviso e para fazer o que faz melhor: sua comédia física exagerada, que beira o overacting, e é totalmente em torno dele que o filme gira, apesar da presença de belos coadjuvantes (Warren Oates, John Candy, John Larroquette, Conrad Dunn), que faltavam no filme anterior de Reitman (exceção feita talvez ao personagem de Jack Blum naquele filme, figura típica do nerd, mas que tinha alguma graça). O grosso da comédia de Murray está aqui voltado ao elogio à insubmissão, já que seu personagem atravessa o filme em eterno conflito com o seu superior no escalão militar, o Sargento Hulka. Há novamente um genial pseudo-discurso motivacional de Murray, semelhante ao de “Meatballs”, dessa vez dirigido a seus colegas de pelotão. Destaca-se ainda a bela sequência de graduação do pelotão, que acorda atrasado para a cerimônia e improvisa uma marcha ao som de um blues cantado por Murray.

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

O Azar de um Valente (When Willie Comes Marching Home, John Ford, Estados Unidos, 1950)

Ford volta à 2ª Guerra, para fazer um filme engraçadíssimo, e ao mesmo tempo bem triste, sobre um cara que vira herói municipal por ser o primeiro habitante de uma cidadezinha a se alistar. Ford está aqui no seu ambiente preferido, pois o filme trata da mesquinhez da população da cidade, que logo começa a se irritar com seu novo herói, uma vez que Willie volta cedo demais para casa, por ficar encarregado de treinar soldados em um campo em sua própria cidade, na qual permanece por 3 anos, sem conseguir ir para a batalha. Willie passa então a ser hostilizado pela população local, que o trata como um covarde. Até sua namorada e seus pais entram na onda. Ford retoma o tema do herói incompreendido, não reconhecido, vs. a sociedade hipócrita e mexeriqueira, constante em sua obra. Este é o primeiro trabalho do diretor com o engraçado Dan Dailey, com quem trabalharia novamente em “What Price Glory” (1952) e “The Wings of Eagles” (1957).